Pensei em como começar a escrever sobre o óbvio tema desta semana. Até ontem, eu falaria hoje sobre as sedes do Brasil na Copa de 2014. O texto foi adiado por tempo indeterminado por conta da tragédia aérea ocorrida no Oceano Atlântico, provavelmente no fim da noite de domingo ou nas primeiras horas da segunda-feira. Um avião da Air France, que saiu do Rio com destino a Paris, às 19h de domingo, desapareceu no mapa depois de passar por Fernando de Noronha, no litoral brasileiro por volta de 23h. Até agora muitas hipóteses são ventiladas, nenhuma confirmada. E até agora, 21h38 de segunda-feira, 1/6, ainda não há nenhuma notícia sobre o paradeiro da aeronave.

Acompanhei cuidadosamente o caso. O dia todo ouvi a Bandnews Fm e li os sites G1 e Folha, preferencialmente, além de outros. Acontece que pouco antes de escrever este texto, algo me chamou a atenção: junto à página especial, um link extra criado no site da Folha, uma publicidade horrorosa. Diante da tragédia de várias famílias e da comoção de milhões de pessoas, a Folha abusou do direito de fazer publicidade. Como vocês podem reparar na foto publicada junto a este texto, quem entrava procurando informações jornalísticas sobre o acidente se deparava com o anúncio de um livro sobre outros acidentes de avião. É o cúmulo da exploração da dor alheia.

Uma das maiores publicações do país perdeu a noção da realidade. Nestes momentos catastróficos é preciso ter sensibilidade. Este sentimento foi percebido ao longo do dia na Bandnews FM, que evitou diversas colunas para fazer a cobertura mais sóbria possível. Até o impagável José Simão ficou de fora da programação. E olha que ele é um dos “puxadores” de audiência. Jornalismo bem feito, ético, inteligente. A Bandnews FM conquista ouvintes a cada dia não pelo que vende, mas sim pelo que faz pelo jornalismo.

Já a Folha fez isso que vocês estão vendo na foto. Ser imprensa é formar opinião, ou, ao menos, promover o debate em torno de alguns pontos. Não adianta fugir disso. Não acredito em manipulação, mas creio no inegável agendamento. E aproveitar-se desta influência para vender um livro é uma vergonha. Nada contra o autor, mas creio que nem ele deva ser a favor da exploração de um momento destes para vender mais alguns exemplares. E nem adianta dizer que era “publicidade automática”, como aquelas que aparecem no e-mail do Google quando se digita algum assunto, pois o link é da Livraria da Folha. E mesmo se fosse automático não diminuiria a vergonha. Imagino que no próximo acidente aéreo a Folha vá oferecer pedaços de fuselagem de algum avião que por um motivo ou outro tenha ido ao solo. “Lojinha da Folha: adquira aqui um pedacinho da história! Parte da Asa do Air France A330 por R$ 44,00 ou em 3x sem juros!” VERGONHA!

Até que a cobertura em geral foi bem feita e bastante informativa. Mas acho, sinceramente, que a Air France tem grande responsabilidade nisso, assim com sua assessoria de imprensa, bastante cuidadosa com o acidente para evitar equívocos num momento complicado. Ao chegar ao aeroporto do Rio ou ao de Paris, os parentes eram logo “pinçados” no meio dos repórteres e levados para salas isoladas. Este movimento evitou colocar no ar pessoas desesperadas, gente chorando copiosamente, entre outras cenas comuns em tragédias assim. Algumas, obviamente, foram inevitáveis, mas não em maioria e isso é um bom avanço. Este que vos escreve envia sinceras condolências aos parentes das vítimas de mais um acidente terrível para a humanidade. E meus sentimentos também à Folha que fez esta lamentável junção entre dor e lucro.